A magnitude do tráfico internacional de drogas, em termos de lucratividade e uso do território, conclama a geografia a se ocupar, cada vez mais, da economia ilegal globalizada. Com base no crime organizado, começa a se esboçar no mundo inteiro, uma repartição de papéis geopolíticos e econômicos desempenhados por uma rede planetária por onde circulam drogas e capitais envolvendo regiões ou países produtores, fornecedores, distribuidores, consumidores, paraísos fiscais* e financeiros, etc.
O Dinheiro das Drogas
O negócio do narcotráfico movimenta, anualmente, algo em tomo de US$ 700 bilhões, se tornando assim, uma das atividades mais lucrativas da economia mundial.
O senso comum acredita que os maiores beneficiários dos lucros do narcotráfico são os países produtores. Nada mais errado. Os lucros gerados no mercado mundial das drogas são partilhados conforme as seguintes estatísticas, segundo o respeitável instituto francês "Observatoire géopolitique des drogues":
• 2 a 5%: Produtores
• 15%: Transformadores e Intermediários nacionais.
• 26%: Transportadores e Traficantes internacionais.
• 54%: Distribuidores nos países consumidores.
Tal divisão se explica pelo fato de o preço da droga variar segundo a sua rota, numa seqüência marcada por multiplicações vertiginosas.
Veja um exemplo de rota do entorpecente no mapa abaixo:
Exemplo 2: (valores em dólares!!) 250 quilos de folha de coca, necessários à fabricação de 1 quilo de cocaína, são comprados a US$ 75 a um plantador boliviano.
O quilo da cocaína será vendido na Colômbia ao preço de US$ 250 (entra em cena aí um multiplicador de 30).
Um consumidor francês pagará o equivalente a US$ 140 a grama de cocaína, ou seja, um quilo de cocaína em Paris (US$ 140.000) tem um preço multiplicado por 1866 vezes desde a venda das folhas de coca!
A extraordinária rentabilidade do negócio das drogas se deve, particularmente, ao sistema financeiro internacional dedicado à lavagem do dinheiro, que processa, segundo a ONU, US$300-600 bilhões por ano. Nos paraísos financeiros, a origem "suja" do dinheiro é encoberta através de operações bancárias que dificultam o rastreamento da moeda e passam a lhe atribuir um novo "certificado".
Parcela expressiva dos lucros do narcotráfico são aplicados em atividades econômicas legais, o que demonstra que a economia ilegal se serve da economia legal. Um dado sintomático a esse respeito vem da Confcommercio, uma das principais associações comerciais da Itália: cerca de 18% dos bares e sorveterias e 15% dos hotéis são controlados pelas máfias italianas, especialmente pela siciliana Cosa Nostra. Além disso, o crime organizado controla, nesse país, 70% da indústria do cimento e se faz presente em atividades como mercado de ouro e antiguidades, agências de viagens, oficinas mecânicas, lojas, etc.
OS "NÓS" DA REDE
Os circuitos que alimentam mundialmente a economia da droga envolvem a quase totalidade do planeta, articulando produção, distribuição e consumo. Destacam-se como países produtores de matérias primas vegetais:
cocaína pronta
a) Folhas de Coca: (matéria-prima para a cocaína): Colômbia, Peru e Bolívia. A área cultivada da Colômbia (que até inicio dos anos 90 era o terceiro maior produtor) aumentou sensivelmente nos últimos dez anos, fazendo da Colômbia o maior produtor mundial de folhas de coca. O Peru e a Bolívia, antes os maiores cultivadores, tiveram suas áreas de produção sensivelmente reduzidas nos últimos anos, em vista de cultivos alternativos desenvolvidos em regiões antes destinadas à coca.
b) Papoula: (matéria-prima para a heroína e outros opiáceos): Afeganistão, Paquistão, Mianmar (antiga Birmânia), Tailândia e Laos (estes três últimos formam o chamado Triângulo de Ouro asiático). A Colômbia também vem se destacando no cultivo de papoulas, face à nova estratégia dos cartéis de diversificar a produção de drogas (a heroína é o novo negócio colombiano).
A INSERÇÃO DO BRASIL NO COMÉRCIO INTERNACIONAL DE DROGAS.
O Brasil desempenha, fundamentalmente, a função de distribuidor, ou seja, de país-trânsito, em vista da pluralidade de rotas e meios oferecidos para o escoamento da cocaína colombiana.
No entanto, embora modestamente, o país já exerce outras funções na economia internacional da droga.
a) É um mercado de consumo em expansão (muito aquém, é verdade, dos EUA, Europa Ocidental ou Japão),
b) Fornecedor de insumos químicos (éter e acetona) à Colômbia para o refino da cocaína.
c) Produtor, no Amazonas e Rondônia, de uma variedade de coca (epadu) e maconha (sobretudo Pernambuco e Maranhão);
d) Centro de lavagem de dinheiro.
Dados fornecidos pela CPI do Narcotráfico, instalada no Brasil em 1999, revelam que cerca de US$ 40 bilhões oriundos do comércio das drogas são "lavados" no Brasil. A rede bancária brasileira, interligada por uma moderna infra-estrutura de telecomunicações, é um forte atrativo para o desenvolvimento de esquemas ilegais de remessas ao exterior e "lavagem" do dinheiro "sujo' (como explicar, por exemplo, a elevadíssima movimentação de cheques em pequenos centros urbanos do Norte e Centro-Oeste do país, cujas economias, muito modestas, não justificam tais transações?).
Além disso, a extensa fronteira com os países andinos produtores de drogas e a diversificação de vias de transporte (fluvial, terrestre, aéreo) viabiliza uma pluralidade de rotas, despistando a vigilância.