Por Ariovaldo Umbelino – 07/04/2008
A grilagem das terras públicas na Amazônia continua nos noticiários. Agora, trata-se da Medida Provisória 422, que dispensa de licitação a venda de terras públicas do INCRA até
Em outro artigo neste site, mostrei que a grilagem das terras públicas da Amazônia sempre veio alimentada pelas políticas públicas dos diferentes governos nos últimos cinqüenta anos. Mas, como a legislação constitucional impede que isso se faça, o caminho passou a ser tentar conseguir através de subterfúgios jurídicos sua legalização. Como a Constituição de 1988 manda compatibilizar a destinação das terras públicas com o plano nacional de reforma agrária, uma nova estratégia passou a ser montada para continuar favorecendo os grileiros do agronegócio.
Uma banda podre dos funcionários do INCRA, particularmente os que "cuidam" do cadastro, passaram a "oferecer" e "reservar" as terras públicas do INCRA para os grileiros e indicar o caminho "legal" para obtê-las. Portanto, quem está realizando esta "grilagem legalizada" é uma parte dos próprios funcionários corruptos do INCRA e dos órgãos estaduais de terra. A denúncia destes fatos já levou a Polícia Federal a fazer a Operação Faroeste no Pará e o Ministério Público Federal a mover ação para cancelar os "assentamentos da reforma agrária laranja" da regional do INCRA de Santarém-PA. O motivo é sempre o mesmo: a tentativa de "oficializar" a grilagem das terras públicas.
Em 2003, o INCRA possuía na Amazônia Legal mais de 60 milhões hectares, assim distribuídas pelos Estados:
► Amazonas, 20,9 milhões de hectares;
► Pará, 17,9 milhões;
► Roraima, 9,2 milhões;
► Acre, 6,2 milhões;
► Mato Grosso, 5,7 milhões;
► Rondônia, 4,9 milhões;
► Maranhão, 1,7 milhões;
► Tocantins, 1 milhão de hectares.
Entretanto, os grileiros do agrobanditismo "cercaram e se apropriaram privadamente" de tudo, pois os funcionários corruptos do INCRA "venderam" para eles ilegalmente todo este patrimônio público. Agora estão junto como o governo Lula, propondo "soluções jurídicas" para legalizar o crime cometido.
A história é a seguinte:
No final do ano de 2005, conseguiram através do artigo 118 da Lei nº. 11.196 de 21/11/2005 (a chamada "Medida Provisória do bem") alterar a lei de licitações públicas (Lei nº. 8.666, de 21/06/1993), conseguindo a permissão para regularizar, através da venda, aqueles que tinham grilado as terras públicas do INCRA na Amazônia Legal com área de até
Em 17/05/2006, o INCRA baixou a Instrução Normativa nº. 32, que fixou os procedimentos legais para que este crime da grilagem das terras públicas até
Mas a banda podre dos funcionários do INCRA não se deu por satisfeita, e, afrontando a Constituição, que manda destinar as terras públicas para a reforma agrária, baixou a Instrução Normativa nº. 41, em 11 de junho de 2007 (publicada no DOU em 18/06/2007), estabelecendo "critérios e procedimentos administrativos referentes à alienação de terras públicas em áreas acima de
E a sordidez destes dilapidadores do patrimônio público não tem limite. Primeiro, com auxílio do agrobanditismo paraense, conseguiram que o deputado Asdrúbal Bentes (PMDB) apresentasse em 24/10/2007 um projeto de lei que ampliava para até 15 módulos fiscais (mais ou menos
Agora, a desfaçatez do governo do PT parece que não tem mais limite. Lula e Cassel, descaradamente, em nome da reivindicação da base aliada, transformaram (plagiaram) o projeto de lei do deputado Asdrúbal Bentes na Medida Provisória nº. 422. Assim, esta MP que já está em vigor, altera novamente a Lei nº. 8.666, permitindo a dispensa de licitação para alienar os imóveis públicos da União até 15 módulos fiscais.
Isto quer dizer que, como 39% da área dos municípios da Amazônia Legal têm módulos fiscais de
A audácia do diretor de Ordenamento da Estrutura Fundiária do INCRA, Roberto Kiel, é de uma adesão total ao agrobanditismo: "agora eles poderão comprar do governo federal as terras que já ocupavam há anos e não vão precisar concorrer com outros interessados", em "Assinada MP para regularização fundiária da Amazônia" (http://www.incra.gov.br).
Outra parte desta engenhosa operação para legalização da grilagem de terras do INCRA na Amazônia Legal foi o aproveitamento do aumento do desmatamento naquela região para fazer o recadastramento dos imóveis. Ele vai permitir que os grileiros que ainda não tinham cadastrado as terras públicas que grilaram até dezembro de 2004 pudessem agora fazê-lo e assim se habilitarem para "comprar" as terras griladas sem licitação. Aliás, a notícia no site do INCRA sobre o recadastramento já, de forma absurda, reconhece os grileiros como posseiros: "Os donos ou posseiros de áreas maiores que quatro módulos fiscais [...] terão que levar ao Incra, de 3 de março a 2 de abril, documentos que comprovem a titularidade ou posse pacífica da terra, plantas e memoriais descritivos com a correta localização geográfica dos imóveis rurais" (http://www.incra.gov.br).
Dessa forma, é preciso deixar claro que as verdadeiras posses das famílias camponesas ribeirinhas ou não na Amazônia não ocupam mais de
Vale lembrar que apenas duas vezes na história do Brasil a grande posse foi legalizada, na Lei de Terra de 1850 e na ditadura militar entre 1964/1984.
Por isso volto a repetir, a MP 422 é uma afronta aos princípios constitucionais e ao patrimônio público: o governo Lula está fazendo o que nenhum governo, depois dos militares, fez, "vendendo" ao agronegócio/banditismo mais de 60 milhões de hectares de terras públicas do INCRA na Amazônia que deveriam ser reservadas à REFORMA AGRÁRIA, à demarcação de terras indígenas e/ou quilombolas e à criação de unidades de conservação ambiental.